Os fariseus, no entanto, não estavam de
modo algum convencidos, e reabriram toda a questão um pouco mais tarde, quando,
num outro sábado, Ele entrou em contato com a necessidade humana em uma das sinagogas
deles. O conflito se enfureceu em torno do homem com uma mão atrofiada. Eles observavam
Jesus esperando que encontrassem um ponto de ataque. Ele aceitou o desafio que estava
silente em seus corações dizendo ao homem: “Levanta-te”
(v. 3), tornando-o bem destacado, e assegurando que o desafio fosse percebido por
todos os presentes.
Outro ponto referente ao sábado é agora
levantado. Seria intenção de Deus pela lei proibir tanto o bem quanto o mal? O sábado
consideraria ilegal um ato de misericórdia?
A pergunta: “É lícito fazer bem ... ou fazer
mal?” pode ser conectada com Tiago 4:17. Se soubermos fazer o bem e ainda assim
o omitimos, é pecado. Deveria o Servo perfeito de Deus, que conhecia o bem e,
além disso, tinha poder total para executá-lo, reter Sua mão de fazê-lo, porque
aconteceu de ser o dia de sábado? Impossível!
Desta maneira impressionante, o santo Servo
de Deus vindicou Seu ministério de misericórdia na presença daqueles que teriam
amarrado Suas mãos com rígidas interpretações da lei de Deus. É importante que aprendamos
a lição ensinada por tudo isso, no caso de cairmos em erro semelhante. A “ lei de Cristo” é muito diferente em caráter
e espírito da “lei de Moisés”, mas pode
ser mal utilizada de maneira semelhante. Se o jugo leve e suave de Cristo for tão
retorcido a ponto de se tornar opressivo, e também um obstáculo positivo para o
escoamento da graça e da bênção, torna-se uma perversão mais grave do que qualquer
coisa que vemos nesses versículos.
Os corações dos fariseus eram duros. Eles
eram suficientemente cuidadosos sobre os aspectos técnicos da lei, mas eram rígidos
quanto a qualquer preocupação com a necessidade humana ou qualquer sentimento de
seu próprio pecado. Jesus viu o estado terrível em que estavam e ficou condoído,
mas não reteve a bênção. Ele curou o homem e os deixou em pecado. Eles ficaram indignados
porque Ele havia quebrado um dos seus preciosos pontos legais. Eles se foram
para ultrajar uma das principais considerações da lei ao tramarem homicídio. Tal
é o farisaísmo!
Diante desse ódio mortal, o Senhor Se retirou
com Seus discípulos. Vemo-Lo Se retirando do brilho da popularidade no final do
capítulo 1. Ele não cortejou o favor, nem desejou provocar discórdia. Aqui encontramos
o Servo perfeito agindo exatamente do modo que é ordenado aos menores servos em
2 Timóteo 2:24.
Mas tal era a Sua atratividade que os homens
O oprimiam mesmo quando Se retirava. Multidões se aglomeravam em torno d’Ele, e
Sua graça e poder se manifestavam de muitas formas, e espíritos imundos reconheciam
n’Ele o Mestre a Quem tinham que obedecer, embora Ele não aceitasse seu testemunho.
Ele abençoava e libertava os homens, mas não procurava nada deles. No início prepararam-Lhe
um pequeno barco no lago no qual poderia Se retirar da opressão da multidão; e então
subiu a uma montanha, onde Ele chamou a Si somente aqueles que desejava, e deles
Ele escolheu doze que deviam ser apóstolos.
Assim, Ele não apenas respondeu ao ódio
dos líderes religiosos Se retirando deles, mas também chamando os doze que no devido
tempo deveriam sair como uma extensão de Seu inigualável serviço. Ele assim preparou
para alargar o serviço e o testemunho. Os doze escolhidos deveriam estar com Ele,
e então, quando seu período de instrução e preparação estivesse completo, Ele os
enviaria. O período de seu treinamento dura até o versículo 6 de Marcos 6. No versículo
7 daquele capítulo, começamos a ler o relato do envio deles.
Esse “estarem com Ele” é de imensa importância para aqueles que são chamados
ao serviço. É tão necessário para nós como foi para eles. Eles tiveram Sua presença
e companhia na Terra. Não temos isso, mas temos o Seu Espírito dado a nós e a Sua
Palavra escrita. Assim, podemos estar habilitados pela oração a manter contato com
Ele, e obter a instrução espiritual, a única que nos capacita a servi-Lo inteligentemente.
Os doze foram primeiramente escolhidos, em seguida instruídos, em seguida enviados
com um poder conferido a eles. Esta é a ordem divina, e vemos essas coisas expostas
nos versículos 14 e 15.
Tendo chamado e escolhido os doze sobre
a montanha, Ele retornou às habitações dos homens e estava em uma casa. As multidões
se reuniram imediatamente. A atração que Ele exercia era irresistível, e as exigências
sobre Ele eram de tal forma que não havia tempo para as refeições. Assim, a primeira
coisa a ser testemunhada pelos doze quando começaram a estar com Ele foi essa forte
maré de interesse e a aparente popularidade de seu Mestre.
Eles logo viram um outro lado das coisas,
e em primeiro lugar que Ele era totalmente mal entendido por aqueles que estavam
mais próximos a Ele de acordo com a carne. Os “Seus parentes” estavam, sem
dúvida, cheios de preocupação bem-intencionada para com Ele. Eles não podiam entender
tais trabalhos incessantes e sentiam que deveriam colocar uma mão restritora sobre
Ele como Se estivesse fora de Si. Luz sobre esta atitude extraordinária da parte
deles é lançada em João 7:5. Neste ponto, em Seu serviço, Seus irmãos não acreditavam
n’Ele, e aparentemente até Sua mãe ainda não tinha uma concepção clara do que Ele
realmente estava fazendo.
Mas em segundo lugar, havia inimigos,
que estavam se tornando ainda mais amargos e inescrupulosos. No versículo 6 de nosso
capítulo, vimos os fariseus fazendo amizade com seus antagonistas, os herodianos,
a fim de tramar Sua morte. Agora encontramos os escribas fazendo uma viagem de Jerusalém
para se opor e denunciá-Lo. Isso eles fazem da maneira mais imprudente, atribuindo
Suas obras de misericórdia ao poder do diabo. Não foi apenas um abuso vulgar, mas
algo deliberado e astuto. Eles não podiam negar o que Ele fez, mas tentaram obscurecer
Seu caráter. Eles presenciaram Seus milagres de misericórdia, e então deliberada
e oficialmente os declararam como sendo as obras do diabo. Esse foi o caráter de
sua blasfêmia, e é bom estarmos bem esclarecidos a respeito disso em vista das palavras
do Senhor no versículo 29.
Mas antes de tudo, Ele os chamou para Si
e lhes respondeu com um apelo à razão. A oposição blasfema deles envolvia um absurdo.
Eles sugeriram, com efeito, que Satanás estava empenhado em expulsar Satanás; que
seu reino e casa estavam divididos contra si mesmo. Se isso fosse verdade, significaria
o fim de todo a obra satânica. Satanás é muito perspicaz para agir dessa maneira.
Temos que admitir, infelizmente, que nós,
Cristãos, não fomos tão astutos para agir dessa maneira. A Cristandade está cheia
de divisão dessa maneira autodestrutiva, e é o próprio Satanás, sem dúvida, que
é o instigador disso. Não fosse o poder do Senhor Jesus no alto permanecer inalterado,
e o Espírito Santo habitando na verdadeira Igreja de Deus, a confissão pública do
Cristianismo teria perecido há muito tempo. O fato da fé não ter perecido da Terra
é um tributo não para a sabedoria dos homens, mas para o poder de Deus.
Tendo exposto a absurda insensatez de suas
palavras, o Senhor passou a dar a verdadeira explicação do que estava acontecendo.
Ele era aqu’Ele mais Forte do que o homem forte, e agora estava ocupado em saquear
seus bens, libertando muitos que haviam sido cativados por ele. Satanás foi amarrado
na presença do Senhor.
Em terceiro lugar, Ele advertiu claramente
esses homens miseráveis quanto à enormidade do pecado que haviam cometido. O Servo
perfeito havia libertado os homens das garras de Satanás na energia do Espírito
Santo. Para evitar admitir isso, eles denunciaram a ação do Espírito Santo como
uma ação de Satanás. Isso era pura blasfêmia; blasfêmia cega de homens que fecham
os olhos para a verdade. Eles se colocam além do perdão com nada além da condenação
eterna diante deles. Haviam chegado a esse terrível estado endurecido de ódio e
cegueira que uma vez caracterizou Faraó no Egito, e que em uma data posterior marcou
o reino do norte de Israel, quando a palavra do Senhor foi: “Efraim está entregue aos ídolos; deixa-o”
(Os 4:17). Deus deixaria esses escribas de Jerusalém sozinhos, e isso não significava
perdão, mas condenação.
Este então era o pecado imperdoável. Entendendo
o que realmente é, podemos facilmente ver que as pessoas de consciência sensível,
que hoje estão perturbadas porque temem que possam ter cometido esse pecado, são
as últimas pessoas que poderiam realmente tê-lo cometido.
O capítulo termina com a chegada dos parentes
dos quais o versículo 21 nos fala. As palavras do Senhor a respeito de Sua mãe e
Seus irmãos pareceram desnecessariamente severas. Certamente havia nelas uma nota
de severidade, que foi ocasionada por Sua atitude. O Senhor estava aproveitando
a oportunidade para dar instruções necessárias a Seus discípulos. Eles O viram em
meio a muito trabalho e aparentemente popular; e também no centro da oposição blasfema.
Agora eles devem ter uma demonstração impressionante do fato de que os relacionamentos
que Deus reconhece e honra são aqueles que têm uma base espiritual.
Antigamente, em Israel, os relacionamentos
na carne contavam muito. Agora eles devem ser colocados de um lado em favor do espiritual.
E a base do que é espiritual reside na obediência à vontade de Deus: e para
nós hoje a vontade de Deus está conservada nas Sagradas Escrituras. Obediência é
a grande coisa. Está na base de todo serviço verdadeiro, e deve nos marcar se estivermos
em relação com o único Servo verdadeiro e perfeito. Nunca nos esqueçamos disso!