Ao começar deste capítulo, a oposição dos
líderes religiosos vem à tona novamente. Os discípulos, cheios de labores – como
o versículo 31 do capítulo anterior nos disse – não estavam observando certas lavagens
tradicionais, e isso despertou os fariseus, que eram os grandes defensores da tradição
dos anciãos. O Senhor aceitou o desafio em favor dos discípulos e respondeu por
uma exposição de toda a posição farisaica. Eles eram hipócritas e Ele lhes disse
isso.
A essência de sua hipocrisia estava na profissão
de adoração, consistindo em cerimônias exteriores, quando interiormente seus corações
estavam completamente distanciados. Nada conta com Deus se o coração não estiver
correto.
Então, ao realizar suas cerimônias, eles
ignoraram o mandamento de Deus em favor de sua própria tradição. O Senhor não apenas
afirmou isso, mas provou-o dando um exemplo cotidiano em que eles separavam o quinto
mandamento de suas regras concernentes a “Corbã”;
isto é, coisas dedicadas ao serviço de Deus. Sob o disfarce de “Corbã”, muitos judeus se despojaram de
todos os seus deveres legais em relação a seus pobres e velhos pais. E faziam isso
com um ar de santidade, pois não parecia mais piedoso devotar coisas a Deus do que
aos pais?
As coisas que vieram sob “Corbã” não eram coisas que Deus exigia; Se fosse assim, Sua demanda deveria ter
prevalecido. Havia coisas que podiam ser dedicadas, se assim desejado; enquanto
a obrigação de apoiar os pais era um comando distinto. A tradição
farisaica permitia a um homem usar uma tradição permissiva para escapar da
obediência de um mandamento claro. Eles poderiam tentar apoiar sua tradição com
evasivas que pareciam piedosas, mas o Senhor os acusou de anular a Palavra de Deus.
As palavras escritas de Êxodo 20:12 foram para Jesus “a Palavra de Deus”.
Não há apoio aqui para essa minuciosa religiosidade que se recusa a atribuir
a designação “Palavra de Deus” às Escrituras.
Cremos que devemos estar certos ao dizer
que toda a tradição humana nas coisas de Deus, em última análise, define a Palavra
de Deus como sendo nada. Os criadores da tradição provavelmente não tinham esse
pensamento, mas o espírito mestre do mal, por trás da questão, tinha exatamente
essa intenção.
Tendo desmascarado os fariseus como homens
cujos corações estavam distantes de Deus, e que ousaram não dar efeito à Palavra
de Deus, o Senhor chamou o povo e publicamente proclamou a verdade que cortava pela
raiz toda a pretensão religiosa. O homem não é contaminado pelo contato físico com
coisas externas, mas é ele mesmo a sede do que contamina. Um duro discurso foi esse, e somente aqueles
que têm ouvidos para ouvir o receberão.
Os discípulos tiveram que perguntar-Lhe
em particular sobre isso, e nos versículos 18 a 23, temos a explicação. O homem
é corrupto em sua natureza. O que vem do seu próprio coração o contamina. De seu
coração procedem os maus pensamentos que se desenvolvem em todo tipo de ato maligno.
Esta é a mais tremenda acusação da natureza humana já proferida. Não é de se admirar
que o coração farisaico estivesse longe de Deus; mas que coisa terrível que homens
com corações assim professem aproximar-se e adorá-Lo.
Estas perscrutadoras palavras do nosso
Senhor cortaram pela raiz todo o orgulho humano, e mostraram a inutilidade de todos
os movimentos humanos, sejam religiosos ou políticos, que lidam apenas com aparências
e deixam o coração do homem intocado.
Seus discípulos ainda mal entendiam essas
coisas, e a experiência vai mostrar-nos que os Cristãos professos são muito lentos
para aceitar e entender essas coisas hoje; mas não iremos muito longe, a não ser
que as entendamos. No entanto, uma coisa é expor o coração do homem: porém algo
mais é necessário – o coração de Deus deve ser expresso. Isto o Senhor fez, como
mostra o resto do capítulo.
Ele foi para as próprias fronteiras da terra
que abrigava tanta hipocrisia, e entrou em contato com uma pobre mulher gentia em
desesperada necessidade. Sua fama chegou até ela e ela não seria renegada. No entanto,
o Senhor a testou por Sua pequena parábola sobre o pão dos filhos e os cachorrinhos.
Sua resposta: “Sim, Senhor; mas também
os cachorrinhos comem, debaixo da mesa, as migalhas dos filhos”, estava felizmente
livre de hipocrisia. Ela disse de fato: “Sim, Senhor: é verdade que não sou como
os filhos do reino, mas um pobre cachorrinho gentio sem qualquer pretensão; mas
estou confiante de que há poder suficiente com Deus e bondade suficiente em Seu
coração, para alimentar um pobre cachorrinho como eu”.
Ora isso era fé. Mateus, de fato,
nos diz que o Senhor a chamou de “grande
fé”, e isso O maravilhou. Também trouxe a ela tudo o que seu coração desejava.
Sua filha foi libertada. Quão grande é o contraste entre o coração de Deus e o coração
do homem! Um cheio de benevolência e graça; outro cheio de todo tipo de mal. Que
gozo para nós quando, em vez de abrigarmos a hipocrisia, somos marcados pela honestidade
e fé.
No versículo 31, Ele volta novamente às
vizinhanças do lago, onde encontra um homem que era surdo e mudo – uma condição
que era um símbolo do estado em que a massa dos judeus era encontrada. A pobre mulher
gentia teve ouvidos para ouvir e, consequentemente, sua língua encontrou palavras
de fé para proferir, mas eles eram surdos e não tinham nada a dizer.
Ao curar esse homem, o Senhor realizou certas
ações, que sem dúvida têm significados simbólicos. Ele o levou para longe das multidões,
para que pudesse tratar com ele em privacidade. Seus dedos, simbólicos da ação divina,
tocam seus ouvidos. O que veio da Sua boca tocou a boca do homem mudo. Assim o trabalho
foi feito, e o surdo e mudo ouviu e falou. Se qualquer ouvido é aberto para ouvir
a voz do Senhor, é o fruto da ação divina que ocorre em oculto. E se qualquer língua
pode proferir o louvor de Deus ou a Palavra de Deus, é porque aquilo que vem de
Sua boca foi colocado em contato com a nossa.
Nada é dito quanto à fé do homem. O que
ele sentia que era incapaz de expressar, e outros o trouxeram a Jesus. Ele foi encontrado,
no entanto, em graça completa e ilimitada. Mais uma vez, foi um caso da bondade
do coração de Deus sendo manifestado por Jesus.
Evidentemente, as pessoas em alguma medida
estavam conscientes disso e, em sua admiração, confessaram: “Ele tudo tem feito bem” (TB). Vinda de
onde ela vinha, essa palavra é tanto mais surpreendente. A parte inicial do capítulo
revela o homem em seu verdadeiro caráter, e vemos que o seu coração é uma fonte
de onde procede nada além do mal – ele faz todas as coisas más! O Servo perfeito
revela a bondade do coração de Deus. Ele faz todas as coisas bem.
Com este veredicto, também temos abundantes
motivos para concordar.