Este capítulo inicia com outra obra de poder
que teve lugar em uma casa em particular, quando depois de algum tempo Ele foi novamente
a Cafarnaum. Desta vez, a fé de um tipo muito robusto aparece, e isso, notavelmente,
por parte dos amigos e não por parte daquele que sofria. O Senhor estava novamente
pregando a Palavra. Esse era o seu principal serviço; a obra de cura foi
incidental.
Os quatro amigos tinham fé do tipo que sorri
diante das impossibilidades e diz: “isso será feito”, e Jesus viu isso. Ele tratou
imediatamente com o lado espiritual das coisas, concedendo perdão de pecados
ao paralítico. Isso era blasfêmia para os escribas argumentadores que estavam presentes.
Eles estavam certos o bastante em seus pensamentos de que ninguém, a não ser Deus,
pode perdoar pecados, mas estavam totalmente errados em não discernir que Deus estava
presente entre eles e falando na Pessoa do Filho do Homem. O Filho do Homem estava
na Terra e na Terra Ele tem autoridade para perdoar pecados.
O perdão dos pecados, porém, não é algo
que é visível aos olhos dos homens; deve ser aceito por fé na Palavra de Deus. A
cura instantânea de um caso grave de enfermidade corporal é visível aos olhos dos
homens, e o Senhor realizou esse milagre. Eles não podiam liberar o homem das garras
de sua doença mais do que poderiam perdoar seus pecados. Jesus poderia fazer as
duas coisas com igual facilidade. Ele fez as duas coisas, recorrendo ao milagre
no corpo como prova do milagre na alma. Assim, Ele coloca as coisas em sua ordem
correta. O milagre espiritual era primário, o corporal era apenas secundário.
Aqui novamente o milagre foi instantâneo
e completo. O homem, que tinha sido completamente impotente, de repente se levantou,
pegou sua cama e caminhou diante deles todos de uma forma que induziu glória a Deus
vinda de todos os lábios. O Senhor ordenou e o homem teve que obedecer, pois a capacitação
foi junto com a ordem.
Este incidente, que enfatiza o objetivo
espiritual do serviço de nosso Senhor, é seguido pelo chamamento de Levi, conhecido
mais tarde por nós como Mateus, o publicano. O chamamento deste homem para seguir
o Senhor exemplifica a poderosa atração de Sua palavra. Uma coisa era chamar
pescadores humildes de suas redes e fadigas: outra era chamar um homem de posses
da agradável tarefa de ajuntar dinheiro. Mas Ele fez isso com duas palavras. “Segue-Me”, caiu sobre os ouvidos de Levi
com tal poder que “ele se levantou e O seguiu”.
Deus conceda que possamos sentir o poder dessas duas palavras em nossos corações!
Que maravilhoso vislumbre recebemos do Servo
do Senhor, Sua prontidão, Sua autoridade, Seu poder, Sua dependência, Sua devoção,
Sua compaixão, Sua recusa do popular e superficial em favor do espiritual e permanente;
e, finalmente, Sua poderosa atração.
Tendo se levantado para seguir o Senhor,
Levi logo declarou seu discipulado de maneira prática. Ele recebeu seu recém-encontrado
Senhor em sua casa junto com um grande número de publicanos e pecadores, mostrando
assim algo do espírito do Senhor. Ele trocou o estar “sentado na coletoria”, pela distribuição de generosidades, para que
outros pudessem se sentar à sua mesa. Ele começou a cumprir a palavra “Ele espalhou, deu aos necessitados” (Sl
112:9 – ARF), e evidentemente sem ter sido instruído a fazê-lo. Ele começou a mostrar
hospitalidade ao seu próprio grupo, a fim de que eles também pudessem conhecer aqu’Ele
que havia conquistado seu coração.
Nisso, ele é um excelente exemplo para nós
mesmos. Ele começou a se dedicar aos outros. Ele fez a coisa que mais prontamente
chegou à sua mão. Ele reuniu aqueles que eram necessitados, e que sabiam disso,
para se encontrarem com o Senhor, em vez daqueles que se satisfaziam religiosamente.
Ele descobriu que Jesus era um Doador, que estava procurando por aqueles que fossem
recebedores.
Tudo isso foi observado pelos satisfeitos
escribas e fariseus, que expressaram sua objeção na forma de uma pergunta aos seus
discípulos. Por que Ele Se associa com tais pessoas tão baixas e degradadas? Os
discípulos não precisavam responder, pois Ele mesmo assumiu o desafio. Sua resposta
foi completa e satisfatória e tornou-se quase um ditado proverbial. Os doentes precisam
do médico e os pecadores precisam do Salvador. Ele não veio chamar os justos, mas
os pecadores.
Os escribas e fariseus podem ter sido bem
versados na lei, mas não tinham entendimento da graça. Ora Ele era o Servo da
graça de Deus, e Levi teve um vislumbre disso. Temos nós isso? Muito mais do que
Levi, deveríamos ter isso, visto que vivemos no momento em que o dia da graça chegou
ao seu ponto culminante. No entanto, é possível que nos sintamos um pouco magoados
com Deus porque Ele é tão bom para com as pessoas que gostaríamos de denunciar,
como Jonas fez no caso dos ninivitas, e como os fariseus fizeram com os pecadores.
O grande Servo da graça de Deus está à disposição de todos os que necessitam
d’Ele.
O próximo incidente – versículos 18 a 22
– revela os opositores novamente em seu trabalho. Antes eles se queixaram do Mestre
para os discípulos: agora se queixam dos discípulos para o Mestre. Eles evidentemente
não tinham coragem de enfrentar face a face. Este método evasivo de achar
defeitos é muito comum: vamos abandoná-lo. Em nenhum dos casos os discípulos precisaram
responder. Quando os fariseus mantiveram a exclusividade da lei, Ele os enfrentou
afirmando a expansividade da graça, e os silenciou. Agora eles desejam colocar sobre
os discípulos a servidão da lei, e Ele efetivamente afirma a liberdade da graça.
Da parábola ou figura que Ele usou claramente
se deduz que Ele mesmo era o Noivo – a Pessoa de importância central. Sua presença
governava tudo e assegurava uma maravilhosa plenitude de suprimento. Atualmente
Ele estaria ausente e então o jejum seria suficientemente apropriado. Vamos tomar
nota disso, pois vivemos no dia em que o jejum é algo apropriado. O Noivo está ausente
há muito tempo e estamos esperando por Ele. No momento em que o Senhor falou, os
discípulos estavam na posição de um remanescente divino em Israel recebendo o Messias
quando Ele veio. Depois do Pentecostes, eles foram batizados em um só corpo e foram
edificados sobre os fundamentos daquela cidade que é chamada de “a Noiva, a esposa do Cordeiro” (Ap 21:9
– ARA). Então eles têm o lugar da Noiva, em vez do lugar dos filhos das bodas; e
essa posição é nossa hoje. Isso só torna ainda mais claro que não festejar, mas
jejuar é o adequado para nós. O jejum é abster-se de coisas lícitas, a fim de estar
mais inteiramente para Deus, e não apenas a abstinência de alimentos para uma certa
exibição.
Os fariseus faziam de tudo para manter a
lei intacta. O perigo para os discípulos, como depois os acontecimentos
provaram, não foi tanto isso, mas a tentativa de uma mistura do judaísmo com a graça
que o Senhor Jesus trouxe. O sistema legal era como uma roupa desgastada ou um velho
odre de vinho. Ele estava trazendo aquilo que era como um forte pedaço de tecido
novo, ou vinho novo com seus poderes de expansão. Nos Atos dos Apóstolos, podemos
ver como as velhas formas exteriores da lei se perderam diante do poder expansivo
do evangelho.
De fato, vemos isso no próximo incidente
com o qual o capítulo 2 se encerra. Mais uma vez os fariseus reclamam dos discípulos
para o Mestre. A ofensa agora era que suas atividades não se encaixavam exatamente
no “odre velho” de certos regulamentos
relativos ao sábado. Os fariseus pressionaram a guarda do sábado até o ponto em
que condenavam até mesmo esfregar espigas de milho na mão, como se estivessem trabalhando
num moinho. Eles contendiam por uma interpretação muito rígida da lei nesses assuntos
menores. Eles eram as pessoas que guardavam a lei com cuidado meticuloso, ao passo
que consideravam os discípulos frouxos.
O Senhor enfrentou sua queixa e defendeu
Seus discípulos lembrando-os de duas coisas. Primeiro, eles deveriam ter conhecido
as Escrituras, que registravam o modo como Davi havia se alimentado a si mesmo e
a seus seguidores em uma emergência. Aquilo que normalmente não era lícito foi permitido
em um dia em que as coisas estavam fora de curso em Israel por causa da rejeição
do legítimo rei. 1 Samuel 21 nos fala sobre isso. Mais uma vez as coisas estavam
fora de curso e o legítimo Rei prestes a ser rejeitado. Em ambos os casos, as necessidades
relacionadas com o Ungido do Senhor devem ser mantidas para se sobreporem aos detalhes
relacionados com as exigências cerimoniais da lei.
Segundo, o sábado foi instituído para o
benefício do homem, e não o contrário. Portanto, o homem tem precedência sobre o
sábado; e o Filho do homem, que detém o domínio sobre todos os homens, de acordo
com o Salmo 8, deve ser o Senhor do sábado e, portanto, competente para dispor dele
de acordo com a Sua vontade. Quem eram os fariseus para desafiar Seu direito de
fazer isso? – apesar de Ele ter vindo entre os homens na forma de um Servo.
O Senhor do sábado estava entre os homens
e estava sendo rejeitado. Sob essas circunstâncias, a disposição desses defensores
da lei cerimonial estava fora de lugar. Seus “odres” estavam velhos e incapazes de conter a expansiva graça e autoridade
do Senhor. O “odre” sábado se quebra
diante de seus olhos.